Num mundo onde a globalização é crescente, mas também um processo com séculos de História (e estórias), este é o registo das impressões e sensações, de um emigrante, numa cultura distinta e distante.
Húsavík situada na baía de Skjálfandi, águas do oceano glaciar Árctico
Quando em Janeiro deste ano regressei à Islândia, fui para o norte, onde nunca tinha estado. Conhecer os locais através de leituras e fotografias, é muito diferente do que vivenciá-los, sentindo o seu pulsar. Neste país, cada espaço tem uma energia própria e uma amplitude que nos faz parar, para melhor interiorizarmos a natureza. Em cada recanto, a relação entre a sobrevivência do homem, a procura de melhores condições e a natureza é admirável.
Tinha passado o natal com a família no Porto e depois da passagem do ano tinha seguido para Valência. Em Portugal e em Espanha tinha estado envolvido no conforto dos afectos e rodeado pela secular história urbana da humanidade. Já na Islândia, em cada floco branco que se derrete no rosto, é o silêncio da natureza que vem afagar-nos.
São 6 horas de viagem de camioneta, para percorrer os cerca de 450 km que separam Reykjavík de Akureyri. Em Janeiro, são 6 horas sob o espesso manto branco que parece adormecer a ilha. A luz natural é quase fugaz e o sol, escondido sempre atrás das montanhas, apenas nos deixa ver uma luz difusa, algures entre o cinzento e o azul-escuro. É na magia do ocaso que elfos, fantasmas e trolls se atrevem a sair das colinas e rochas que habitualmente lhes serve de esconderijo. É que o sol do verão não os protege. Antes os cega e petrifica.
Assim, todos eles se multiplicam durante o Inverno islandês.
A igreja de Húsavík É uma das mais atraentes igrejas islandesas. Foi desenhada pelo arquitecto islandês Rögnvaldur Ólafsson e construída em 1907, usando madeira norueguesa. Tem uma capacidade para 450 pessoas e quando foi construída, a povoação não tinha mais de 500 habitantes. No altar existe uma impressiva pintura de 1931, pelo pintor e agricultor Sveinn Pórarinsson, representando Lazarus a erguer-se da morte.
Quando cheguei a Akureyri tinha o meu amigo Matin à espera. Tinha trabalhado com ele antes do natal em Reykjavík. O Matín tinha-se mudado para o norte, depois de ter aceite um convite para ser o chefe de cozinha num restaurante em Húsavík. Sendo assim, fui com ele passar 3 dias à capital da observação das baleias (whale Watching), como é denominada a povoação.
Husavík é uma pequena cidade situada no norte da Islândia, na baía de Skjálfandi e com uma população 2500 habitantes. O nome significa baía-casa e foi escolhido por Gardar Svarvasson numa viagem em 850 DC, ainda antes do primeiro colonizador oficial da ilha.
A cidade destaca-se pela sua característica igreja, rodeada por casas de telhados coloridos em frente ao porto.
Husavík vivia exclusivamente da indústria pesqueira, mas o turismo tem vindo a crescer.
Os islandeses são na sua maioria, contra a lei internacional que proíbe a captura e matança destes mamíferos. Mas neste caso, o apurado faro para o negócio de uma família, descobriu que afinal as baleias podem, através do turismo, impulsionar mais a economia local do que da matança. Assim, restauraram e adaptaram 3 barcos de pesca e passados 13 anos e mais de 6 mil viagens, Húsavík transformou-se na capital europeia da observação das baleias (whale watching).
A North Sailing, empresa criada por uma família com o intuito de desenvolver o turismo na cidade, reconstruiu e adaptou 3 barcos de pesca para a observação de baleias (whale watching). O primeiro foi o Knörrinn (4,12 m de comprimento e uma capacidade de 46 pessoas). Seguiram-se o Bjössi Sör (4,34 m e capacidade de 56 pessoas) e o Náttfari (5,30 m e capacidade de 90 pessoas). Náttfari foi um viking sueco que ficou perdido com 2 escravos na baía que abriga Húsavík, ainda antes da colonização oficial da Islândia. Como foi de forma involuntária, não é considerado o primeiro habitante e colonizador do país. Obviamente, esta interpretação oficial defendida pelos políticos e académicos não é corroborada pelos habitantes da cidade.
Neste vídeo, podemos observar as baleias através dos barcos pejados de turistas. Assim, fica-se com uma ideia do passeio turístico para observação destes mamíferos na baía de Skjálfandi.
Fiz pouso 2 noites em casa do Matín que me revelou alguns segredos da cidade. Alguns locais nos arredores que os naturais não gostariam que fossem invadidos por turistas, mantendo-os para usufruto próprio, como se de espaços sagrados se tratassem. Mas também nós em nossa casa, mantemos algumas divisões mais resguardadas das visitas. Um desses locais, é um grande tanque que fica no topo do Húsavikurfjall (417 m) e que recebe agua do interior da terra a mais de 36 º C. Imagine-se o que é estar à noite, a tomar banho num tanque de agua geotermal, rodeado de neve e bebendo uma cerveja com um amigo. Pois é, tive esse privilégio debaixo do olhar atento das estrelas.
Não queria acabar este post sem referenciar os 3 museus da cidade:
O Safnahúsid Museum que inclui o museu etnográfico, o museu marítimo, a colecção de história natural, a colecção de fotografias, a colecção de pinturas e os arquivos do Distrito.
Por último o Husavík Whale Museum (museu das baleias) fundado em 1977. Vários jovens cientistas de outros países acabam por fazer estágio neste museu que tem um papel informativo relevante. O seu corpo científico acaba por servir-se, muitas vezes, dos barcos que passeiam os turistas, como plataforma de estudo das baleias no seu habitat natural.
Com as várias fotos que aqui deixo, os vídeos, as informações e impressões, penso ficarem com uma ideia sobre este local, ao qual voltarei em breve.
Gaumli Baukur é o nome do restaurante bar do qual o Matín é o chefe da cozinha. É uma casa em madeira nórdica construída em 1843, como residência de Mr. Shulsen, o magistrado do Distrito. Entre 1884 e 1904 foi um popular restaurante e em 1960 destruída por um incêndio. Reconstruída em 1998 é pertença da família que explora o whale watching. Na reconstrução da casa não foram cortadas árvores. A madeira, bem como todos os instrumentos náuticos no seu interior, é um legado do mar que sedimenta os seus despojos ao longo da baía.
Chegado o inverno, a ilha vestiu-se de noiva, deslumbrando-nos a cada instante com o charme da solitude épica. Os tons púrpuras do céu, revelam-nos as infinitas possibilidades dos dégradés do extenso manto branco.
Esta é uma das paisagens que me acaricia quase diariamente.
Com os seus 60 km de extensão, o Eijafjördur (fiorde Eyja) é dos maiores e mais belos da Islândia. Akureyri, Grenivík, Dalvík ou a ilha de Hrisey, são alguns dos núcleos populacionais ao longo do fiorde a merecer uma visita.
Charming and fair is the land,
and snow-white the peaks of the glaciers,
Cloudless and blue purple is the sky,
the fjord is shimmering bright...
adaptação livre de um excerto do poema Iceland de Jónas Hallgrímsson